Paulo Zifum
Conversei com um amigo reprimindo-o por sua atitude negativa, infantil e nada razoável. Ele reconheceu e mostrou arrependimento, confessando que ter agido errado. Quando reunimos as partes ofendidas, eu perguntei se ele gostaria de falar algo. Ele endureceu-se e reafirmou sua turrice. Foi uma tragédia. Eu pensava que ele ia, mas não foi.
Por que nos arrependemos de fazer as coisas corretas? Por que recuamos da bondade? Por que falamos e depois não conseguimos fazer? Por orgulho? Por medo? Por dinheiro?
A resposta, podemos avistá-la na auto-traição de Saul. Ele era um rei e isso, por si, já indica uma pessoa exposta à opinião pública. A mais leve mudança nos níveis da autoestima pode desencadear reações muito suspeitas.
A história de Saul começou quando ele foi escolhido para ser o primeiro rei de Israel (1Sm.10.20-27). Ele se escondeu mostrando insegurança ou aparente humildade, mas acabou sendo achado e feito rei. Uma nota no texto merece destaque: “Mas os filhos de Belial disseram: É este o que nos há de livrar? E o desprezaram, e não lhe trouxeram presentes; porém ele se fez como surdo” (1Sm.10.27). Depois de um tempo de reinado, surgiu um jovem guerreiro chamado Davi que arrebatou a afeição da nação. As “mídias” sociais da época só falavam de Davi e ofuscavam a liderança de Saul. Este ficou ressentido, começou a perseguir Davi e até tentou matá-lo (1Sm.18). Porém, chegou a reconhecer que estava errado e se dispôs a mudar:
“Jônatas falou bem de Davi a Saul, seu pai, e lhe disse: “Que o rei não faça mal a seu servo Davi; ele não lhe fez mal nenhum. Ao contrário, o que ele fez trouxe grandes benefícios ao rei. Ele arriscou a vida quando matou o filisteu. O Senhor trouxe grande vitória para todo o Israel; tu mesmo viste tudo e ficaste contente. Por que, então, farias mal a um inocente como Davi, matando-o sem motivo? “Saul atendeu a Jônatas e fez este juramento: “Juro pelo nome do Senhor que Davi não será morto”. Então Jônatas chamou a Davi e lhe contou a conversa toda. Levou-o até Saul, e Davi voltou a servir a Saul como anteriormente. E houve guerra outra vez, e Davi foi lutar com os filisteus. Ele lhes impôs uma grande derrota e eles fugiram dele. Mas um espírito maligno mandado pelo Senhor apoderou-se de Saul quando ele estava sentado em sua casa, com sua lança na mão. Enquanto Davi estava tocando harpa, Saul tentou encravá-lo na parede com sua lança, mas Davi desviou-se e a lança encravou na parede. E Davi conseguiu escapar” 1Sm.19.4-10.
Note que Deus manda um “espírito maligno” para atacar Saul. Isso pode ser melhor entendido na tese paulina abaixo:
“E, por haverem desprezado o conhecimento de Deus, o próprio Deus os entregou a uma disposição mental reprovável, para praticarem coisas inconvenientes, cheios de toda injustiça, malícia, avareza e maldade; possuídos de inveja, homicídio, contenda, dolo e malignidade; sendo difamadores, caluniadores, aborrecidos de Deus, insolentes, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais, insensatos, pérfidos, sem afeição natural e sem misericórdia. Ora, conhecendo eles a sentença de Deus, de que são passíveis de morte os que tais coisas praticam, não somente as fazem, mas também aprovam os que assim procedem” Rm.1.28-32
A “disposição mental reprovável” é vista em nossa incoerência de dizer uma coisa e fazer outra. Golpeamos nossa própria consciência quando somos duros, quando revidamos e agimos sem misericórdia. Fracassamos quando deixamos de fazer o que é reto por temor dos homens, por orgulho ou por fama ou dinheiro.
Segundo o texto acima, temos somente Deus para nos socorrer. Se Saul recorresse a Deus, se buscasse segurança em Deus, conseguiria sustentar suas boas intenções. Segundo está escrito: “porque Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (1Pe.5.5). Ora, a capacidade de enfrentar a Cruz e negar a si mesmo já é, em si, uma graça para o cristão que, a partir disso, consegue viver de modo coerente com seu discurso.
Todos temos fraquezas como Saul. Todos podemos ter um comportamento inseguro, mas falar uma coisa num dia e fazer outra no dia seguinte, revela desvio de caráter e, repetidas vezes, mostra a falta de auxílio divino. Ora, nenhum homem após Adão pode viver 100% por suas palavras. Apenas em Deus “não há mudança nem sombra de variação” (Tg.1.17). Nós não podemos financiar todas as nossas promessas. Essa condição da natureza caída, da qual Paulo fala, prostra-nos de vergonha pois “não faço o bem que quero, mas o mal que não quero, esse faço” (Rm.7.19).
Depois que prometemos que vamos, como ir? A resposta está em João 15.5 e em Filipenes 2.13.
*Foto: Flautista de likes: a incoerência de concordar com postagens antagônicas